📚 | Marketing e liderança pelo mundo com Tiago Santos, General Manager na Danone | Parte 2 de 3
Com uma carreira enraizada no marketing, evoluiu entretanto para a gestão geral, incluindo a liderança global da marca Danone na Bielorrússia, Cazaquistão, Cáucaso e Ásia Central.
“Os meus maiores orgulhos não são as campanhas que fiz, mas a quantidade de pessoas das minhas equipas que foram promovidas e os resultados que tive em todos os lugares onde estive.”
Esta é a segunda de três partes da entrevista a Tiago Santos, General Manager de General Manager da Danone na Bielorrússia, Cazaquistão, Cáucaso e Ásia Central.
Com uma carreira enraizada no marketing, evoluiu entretanto para a gestão geral, incluindo a liderança global da marca Danone na Bielorrússia, Cazaquistão, Cáucaso e Ásia Central.
Falamos com um profissional que já viveu em oito países, é proficiente em 5 línguas e tem experiência de mercado na Europa Ocidental e Oriental, América Latina e África.
Pode ler a primeira parte da entrevista aqui.
Nota Prévia: a entrevista dada por Tiago Santos reflete opiniões unicamente pessoais e não uma posição institucional ou opiniões corroboradas pela empresa.
Hoje és General Manager (GM), mas toda a tua carreira foi feita na área de marketing. Em que é que o teu passado como marketer impacta o que fazes hoje em dia?
Sinceramente, para chegar a GM tens de saber que não tens de ser o maior expert numa área: precisas de ser líder, de saber ouvir e de não ter medo de tomar decisões. E, depois, a chave: de te rodeares de uma boa equipa.
Eu, a partir dos meus 8 anos de carreira, decidi que queria ser GM. E para ser GM sabia que tinha de dominar várias áreas, muito para além do marketing: por isso, apesar do passado em marketing, escolhi experiências em que me aperfeiçoei mais em vendas, outras na parte operacional... por isso não há uma visão exclusiva de marketing.
Claro que estando mais à vontade em marketing e vendas, intervenho mais nessas áreas, porque sei que são temas onde posso acrescentar mais. Mas essencial, mesmo, é ires buscar pessoas que complementem o conhecimento existente. Contratar pessoas mais experientes para as áreas onde podes acrescentar menos.
E como é que se constrói uma equipa forte?
A escolha de pessoas mais experientes ou menos experientes vai depender sempre da capacidade e conhecimentos que o GM e que a equipa têm. Se for uma área em que não há expertise, contratamos alguém sénior. Se já temos esse conhecimento na equipa, contratamos alguém júnior e ajudamos a pessoa a crescer. Depois, é preciso liderar a equipa, nivelá-la por cima.
Quais são os momentos, campanhas, ações, feitos, de que mais te orgulhas, nestes anos, todos como profissional?
Os meus maiores orgulhos são dois: a quantidade de pessoas das minhas equipas que foram promovidas e os resultados que tive em todos os lugares onde estive. Para mim, resume-se muito a isso, a entregar resultados qualquer que seja o contexto.
Quanto a campanhas, gravei cerca de 130 campanhas, lancei marcas, matei marcas, fiz fusões, geri marcas locais e globais... confesso que essa parte já não me interessa tanto. O que interessa não é o input que dei, mas o output: se aumentei os resultados e ultrapassei os objetivos que estavam fixados. Há pessoas que contratei já nesta última experiência e que já foram promovidas em dois níveis em relação a quando entraram. Transformar negócios complicados. Vender fábricas e resolver problemas estruturantes na organização. Isso, sim, é o que me orgulha.
Já não são a campanha, a marca, o projeto que me movem... são muito mais as formas de trabalho, a performance que a minha equipa alcança e o seu impacto no resultado final.
Falas muito da paixão pelo desenvolvimento das pessoas. Como é que consegues contribuir para esse crescimento pessoal e profissional?
Acreditando no potencial das pessoas. Muitas vezes, acreditando mais nas pessoas do que elas próprias acreditam. Acreditar que podem entregar mais do que elas pensam - o que, depois, leva a um grau de exigência altíssimo, não nego.
Como é que ajudas as pessoas a entregar mais, na prática? Através do que se chama transformational leadership: primeiro, é preciso esquecer o passado. Depois, define o futuro que queres para ti e garante que as circunstâncias se adaptam ao futuro que escolheste. Acaba por ser sempre isto.
Lideraste equipas em tantos países diferentes... Como foi adaptares-te a países e mercados tão diferentes como a Espanha e Finlândia, África e Europa Central, Rússia e América Latina?
Acho que o mais importante é teres a mentalidade certa: ou gostas de ir para fora e estás disposto a adaptar-te ou nunca vais longe. E, mesmo que vás longe, não vais ser feliz. Entre Espanha e Portugal, sinceramente, vai tudo dar ao mesmo. Mas a Finlândia, por exemplo, já foi mais difícil: a parte social, a luz e o tempo no inverno...
Quando passas por choques tão grandes como esse, tens de pensar bem no que queres para ti. Eu percebi que em qualquer lado para onde vá, vou encontrar qualquer coisa que me agrade e que me faça crescer a nível profissional, pessoal ou ambos. Se não conseguir isto, não vale a pena andar a viajar de sítio em sítio.
O que é que foi tão complicado na Finlândia?
Culturalmente é muito diferente. A primeira coisa que aprendi na prática foi que a distância do braço é considerada espaço pessoal para um finlandês. Portanto, se alguém mete a mão no ombro ou tem a proximidade que há em Portugal ou em Espanha, isso é considerado estranho e é mal visto.
O segundo choque foi perceber que não se pode discutir o país. A Finlândia é um país com impostos altíssimos e serviços públicos muito bons, com uma enorme influência soviética - mesmo tendo lutado várias vezes contra os russos. Mas não podes nem questionar o sistema nem falar da influência soviética... foram mais duas coisas que descobri da pior maneira.
O terceiro foi o facto de vir de Portugal e de Espanha habituado a fazer vida social com as pessoas do emprego e ali não fazes. E ainda pior se és chefe e estrangeiro. Foi muito complicado.
E ainda há o clima e os desafios próprios de qualquer emprego: eu, mal cheguei, apanhei 35º negativos, não havia luz... demorei algum tempo a perceber a dinâmica da equipa que estava a liderar e tive de me ir adaptando e de ir ajustando a equipa ao mesmo tempo que tudo o resto acontecia.
Mas isto foi um primeiro impacto. No segundo ano lá, a maior parte destas dificuldades estava ultrapassada e decidi que tinha de gostar do país, da equipa, do desafio. Isso foi o que de melhor retirei desta experiência.
Em termos de trabalho é muito diferente de Portugal ou de Espanha?
Muito. E ainda mais na época em que lá estive. Quando fui de Espanha para lá, a lógica em Espanha era a de trabalhar muitas horas por dia. Hoje em dia isso mudou muito, principalmente depois do covid, em que pouco importa o número de horas e a presença física. Tu entregas o que tens de entregar e fazes isso como tu quiseres.
Se voltasse hoje à Finlândia, não poria a pressão no ser preciso trabalhar muito mais... mas na necessidade de acelerar para melhorar os resultados. Se consegues entregar tudo com 4 horas por dia, fantástico.
Mas na altura, vindo de Espanha, cheguei lá com esse ritmo e mentalidade de trabalho... e eles lá são inflexíveis: têm 8 horas de trabalho, 8 horas de vida social e 8 horas de sono por dia e respeitam muito isso. E isso nem sequer é tema. Para mim, com objetivos tão ambiciosos como os que tinha e uma equipa num ritmo tão lento e que ninguém queria mudar, foi complicado.
Conseguiste mudar essa mentalidade?
Foi um trabalho complexo, porque para o conseguir ou mudas as pessoas ou a sua mentalidade, para que haja um alinhamento entre os teus objetivos, os da empresa e os da equipa.
Se não houver este alinhamento, como líder erdes sempre. É como estar num barco no qual tu estás a remar que nem um doido e toda a gente sentada a olhar para ti... Se obrigares toda a gente a remar como tu, vais acabar na água. Porque, provavelmente, vão te empurrar para a água. Isso foi uma experiência brutal.
E como é que deste a volta ao problema?
Primeiro, tive de me focar em mim e de enquadrar as minhas expectativas: não podia procurar ali o que tinha em Barcelona, porque isso não ia acontecer. Depois, analisei o que tinha feito bem e mal.
Em termos de equipas, de pessoas, de vida, acho que há duas opções que podes seguir: have what you want (tem o que queres), want what you have (quer o que tens).
Até à Finlândia eu sempre segui a máxima de ter o que queria: tive 6 empregos em 10 anos, cada vez que não estava contente ou que surgia uma oportunidade boa saía. A prioridade era ter um carro melhor e um salário maior e fui conseguindo.
Quando cheguei à Finlândia, percebi que tinha de mudar para querer o que tinha.
Tinha chegado a uma realidade e precisava fazer com que aquilo que ali estava resultasse. Então comecei a trabalhar com as pessoas que tinha - só substituí uma pessoa - e foquei-me nos resultados da equipa.
Com os resultados a melhorarem, fui ganhando confiança da estrutura e pude reforçar a equipa. E quando contratas... é muito mais fácil contratares pessoas novas com uma mentalidade diferente, com ambição diferente, do que refazeres uma equipa toda de raiz. Isso ajudou a mudar muito a equipa que tinha, porque fui identificando os problemas e resolvendo cada um deles. Levei isso para a Ucrânia, também, onde fui de uma equipa de 4 para 31 pessoas. Havia um programa de estágios com 5 ou 6 estagiários em permanência e cada vez que havia uma vaga era preenchida por uma pessoa do programa.
É a maior aprendizagem que retiras da experiência na Finlândia?
Essa é uma, mas há outra: garante que, independentemente do teu cargo, falas com todos os níveis da organização. Porque, se não, arriscas-te a tomar decisões que são limitadas pelo teu campo de visão, que é a pessoa que está diretamente abaixo de ti na hierarquia. E essa pessoa nem sempre quer o teu bem, por isso pode levar-te a tomar decisões que não são boas para ti nem para a equipa. Hoje eu giro 10 países e nos primeiros 6 meses fi-lo a partir de Paris... Faço questão de aplicar essa aprendizagem.
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